Seu Pedro, 83 anos, volta à escola e diz: “Quero ser bem-visto na sociedade”
Aluno da 5ª fase da Educação de Jovens, Adultos e Idosos (Ejai) já foi morador de rua e vai representar Alagoas em Encontro Regional, no Piauí

O tempo não foi capaz de destruir o sonho de ler e escrever do aposentado, e aluno da Educação de Jovens, Adulto e Idoso (Ejai) da Escola Municipal Hévia Valéria, em Maceió, Pedro Lopes da Silva. Às vésperas de completar 84 anos, o sonho de se alfabetizar só foi possível mais de oito décadas depois.
Ex-morador de rua, pai de 8 filhos, 16 netos e 4 bisnetos enxergou no trabalho o pilar para alfabetizar toda sua família. Natural da cidade de Boca da Mata, de família humilde, filho de pais agricultores, Pedro Lopes conta que não estudou no passado porque não teve escolha. Seu primeiro contato com os livros foi exatamente aos 60 anos de idade.
"Eu fui morador de rua dos 14 aos 16 anos. Estudar não era uma opção para mim naquela época, eu precisava trabalhar para sobreviver. Eu tinha que trabalhar para o meu sustento. Eu tomei a iniciativa quando tinha 60 anos e comecei a estudar, mas em virtude da saúde da minha esposa e do meu sustento eu parei, com o tempo e já aposentado voltei a estudar", afirma o aluno.
Só depois de 20 anos do seu primeiro contato com os estudos seu Pedro decidiu retornar à escola para não mais desistir: "Depois que me aposentei, a minha esposa morreu, já aposentado, votei a estudar. Eu não pensei que a escola era tão importante na vida de uma pessoa. Eu tive muitas dificuldades no início da minha vida, eu morei na rua, mas me recuperei".
Para que seus filhos não tivessem o mesmo destino, ele garantiu que todos concluíssem os estudos.
"Todos conseguiram concluir os estudos com muito orgulho, tenho filho professor, policial. Eu não estudei, mas eu trabalhei para que os meus filhos estudassem. Depois que eu deixei cada um no seu lugar, sem precisar mais de mim, eu comecei a estudar"
Ao longo da vida seu Pedro fez de tudo um pouco: foi eletricista, encanador e mestre de obras. No dia a dia a falta do estudo chegou atrapalhar alguns afazeres. Sem saber ler e escrever, seu Pedro precisava recorrer às pessoas alfabetizadas para fazer a relação, por exemplo, de material de almoxarifado.
“Eu entendia de muita coisa, mas se eu soubesse ler e escrever não estaria diante daquela situação. Comecei como encanador, eletricista, já fui agricultor, soldador, padeiro, fui muitas coisas. Eu sabia que se eu estudasse, eu ia ganhar um lugar ainda mais de destaque. Eu precisava muito estudar”, reforçou.
Livros
Ele conta que quando entrou na escola enxergou outro mundo: “Eu vi um mundo de outro jeito. O mundo que a mim foi negado. Depois que eu retornei a estudar, eu aprendi a ler, a contar e ver o mundo de outra forma. Eu aprendi a ler livros. Da escola eu tirei a noção de ler e também de interpretar, porque não é só saber ler", conta.
Depois que virou leitor assíduo, seu Pedro adquiriu vários livros e até indicou o livro que está lendo no momento. “Estou lendo o Quarto de Despejo, da autoria de Carolina Maria de Jesus, um livro muito bom e muito parecido com o que vivi no passado”.
Paulo Freire
Para demostrar a importância da educação em sua vida, seu Pedro fez questão de lembrar o legado do educador Paulo Freire reforçando com suas palavras a frases transcritas em sua camisa. "A educação é um ato de amor, por isso, um ato de coragem".
"Sei da importância de Paulo Freire e por isso a minha luta é pela continuidade da educação, pelo o que conheço, o meu conhecimento foi ele quem começou, foi ele quem alfabetizou as pessoas que têm a dificuldade de estudar e aprender, ele queria que as pessoas fossem libertadas", avaliou.
Muito sábio e bastante inspirador, seu Pedro fez questão de deixar uma mensagem de incentivo para os estudantes que estão fora da sala de aula, além de revelar que seu sonho era ser advogado: "Dê continuidade aos estudos. Não pare. A educação forma a pessoa, e a deixa cada dia melhor. Se eu fosse me formar eu seria advogado, acho muito bonito", ressaltou ele.
Para o futuro, seu Pedro disse quer ser bem-visto na sociedade. “O meu plano para o futuro é ser uma pessoa que seja bem-vista na sociedade, saber falar, se expressar”, destaca.
Encontro Regional da Ejai
Seu Pedro talvez ainda não saiba, mas já chegou lá, e já se tornou bem-visto como ele mesmo falou. O aluno vai representar os estudantes alagoanos no Encontro Regional da Educação de Jovens, Adultos e Idosos, que será realizado este ano no Piauí.
Para ele é uma grande satisfação. “Na oportunidade, eu quero reforçar que os governantes deem continuidade à Educação de Jovens, Adultos e Idosos. Eu vou dizer sempre que continuem a estudar. Vou dizer que nós não podemos parar e que precisamos do apoio dos prefeitos e dos governadores de cada estado com politicas públicas para a Ejai, se a gente sai do analfabetismo eles crescem também. Se eles menosprezarem, a educação vai ficar ruim pra todo mundo”, afirmou o estudante.
Secretaria Municipal de Educação
Rua General Hermes, 1199 - Cambona
CEP 57017-201 // Telefone: (82) 3312-5608
Horário de atendimento: segunda a sexta, de 8h às 14h.