Xangô Rezado Alto discute Memória do Quebra e racismo religioso
Yalorixás, Babalorixás e pesquisadores debateram o tema durante o Vamos Subir a Serra
A mesa A Memória do Quebra de Xangô e o Racismo Religioso debateu, nesta sexta-feira (29), a trajetória histórica do episódio, ocorrido entre o dia primeiro e a madrugada do dia dois de fevereiro de 1912, que ficou para a História alagoana como uma das mais violentas ações contra Yalorixás, Babalorixás e adeptos do candomblé e da Umbanda. Eles foram espancados, presos e tiveram seus objetos religiosos quebrados pela Liga Republicana dos Camponeses que fazia oposição ao então governador Euclides Malta, acusado pela Liga de participar de rituais religiosos de matriz africana.
A presidenta da Fundação Municipal de Ação Cultural (FMAC), Mírian Monte, destacou a importância de discutir o tema e explicou por que a Fundação, em comum acordo com as lideranças religiosas, realizaram um evento simbólico, no lugar do cortejo que marca a data, e que vem sendo realizado pela FMAC desde o ano de 2013. “Estamos em plena pandemia e tivemos que marcar a data com uma celebração simbólica, mas temos a oportunidade de beber de toda a sabedoria dos pais e mães de santo aqui presentes e para consolidar direitos é preciso trilhar o caminho do respeito e do amor”, pontuou Mírian.
A Assessora Especial da Fundação, Whytna Cavalcante, abriu a mesa ao chamar os participantes e falar da necessidade de combater a intolerância religiosa. ” O combate ao racismo religioso deve ser diário com ações efetivas para que a sociedade respeite as religiões de matriz africana”, revelou Whytna. A mesa foi mediada pela pesquisadora e filha de santo, Gabriela Torres. Mãe Mirian (Yá Dinam) ao se dirigir ao público falou do próprio processo de discriminação que sofreu ao longo de sua trajetória de vida. A líder religiosa, viu, sofreu e testemunhou, ainda adolescente, o período de discriminação sofrida pelos adeptos do Candomblé e da Umbanda ao rezar o Xangô em silêncio.
Mãe Vera de Oya (Yá Balé Cyde) abordou a própria discriminação sofrida pelo poder público municipal, já que no dia 19 de abril de 2020, foi despejada da comunidade em que vivia no Otacílio Holanda, local onde a Yalorixá mantém uma Casa de Axé. “Adoeci depois do despejo e prejudicou a diabetes. Sou uma mulher preta, que perdi um membro, o meu pé, mas não perdi a batalha”, disse a líder religiosa.
Mãe Jane Yara (Yá Omyn Nare Omyn) falou sobre a importância da união das lideranças religiosas de matriz africana para combater a discriminação e o racismo religioso mantendo assim o respeito da diversidade das nações entre as diversas Casas de Axé de Maceió para o setor público manter a política de combate à intolerância.
Pai Wagner do Xoroquê (Babá Xoroquê do Ilê Alaketu) chamou a atenção para mostrar como a intolerância religiosa ainda está presente ao relatar o despejo que sofreu, junto à Mãe Vera, na comunidade conhecida como Portelinha, localizada nas imediações do Conjunto Residencial Eustáquio Gomes, bairro Cidade Universitária. “A população de lá é vítima da vulnerabilidade social, é preta e periférica. Para nós que somos líderes de religiões de matriz africana, a nossa luta é grande”, falou o babalorixá.
A Ekedi Lucélia Tainá falou sobre a importância dos jovens ocupar os espaços públicos e retornar aos terreiros para socializar o saber já que o racismo é praticado pela sociedade e é preciso combatê-lo fazendo com que a toda a comunidade ouça os jovens que são praticantes das religiões de matriz africana. Lucélia foi a representante de Pai Célio de Yemanjá (Babá Omyn Tology).
Foto: Daniel Marinho
O antrópolo, professor e pesquisador, Edson Bezerra chamou a atenção dos participantes para os espaços públicos construídos pela negritude alagoana, a exemplo de igrejas católicas, como a do Rosário, Martírios, São Benedito e Nossa Senhora das Graças. Edson recordou que foi um dos idealizadores do Xangô Rezado Alto cujo primeiro cortejo ocorreu em 2006 ao percorrer o trajeto da Praça 13 de Maio, onde está a escultura da Mãe Preta, criada pelo mestre Zumba, até a Praça Sinimbu, local que abrigava um terreiro que foi destruído. O pesquisador afirmou que o projeto original do evento já previa a incorporação da economia criativa e não se restringia apenas aos cultos de matriz africana, mas levava em consideração a memória e a herança negra alagoana.
Edson contou que a ideia original era afixar placas nos locais em que os terreiros de Candomblé foram massacrados ou destruídos, nos bairros Jaraguá, Farol e no Centro da cidade, fazer a articulação entre os quilombos urbanos, o artesanato e a cultura afro com a realização de um Festival de Cultura Negra envolvendo os afoxés, maracatus e as demais manifestações culturais e artísticas como a dança afro, o samba de pagode, as baianas, o movimento Hip Hop, o reggae. “A religiosidade de matriz africana não deve ficar à parte da sociedade alagoana que deve conceber que a alma do povo alagoano é a cultura negra exposta no corpo, na oralidade, nas cores, nas vestimentas e indumentárias”, afirmou o professor e pesquisador.
Foto: Daniel Marinho
Ascom/FMAC
Fotos: Daniel Marinho
Fundação Municipal de Ação Cultural
Rua Melo Morais, nº 59, Centro
CEP: 57020-330 // Telefone: (82) 3312-5820
Horário de atendimento: segunda a sexta, de 8h às 14h.
E-mail: [email protected]