Tradição e resistência marcam o Dia da Cultura Popular em Maceió

Guerreiro Grande Poder celebra legado de Mestre Verdelinho e a força da tradição

Thauane Rodrigues/ Ascom FMAC 22/08/2025 às 08:30
Tradição e resistência marcam o Dia da Cultura Popular em Maceió
Guerreiro Grande Poder estreia no Festival da Cultura Popular com homenagem a mestre Verdelinho. Foto: Higor Vinícius/Ascom FMAC

Entre as águas cristalinas que encantam o mundo, Maceió guarda outra riqueza que vai além das praias: a força da cultura popular. Nos quatro cantos da cidade, os folguedos enchem as ruas de cores, sons e histórias. Guerreiros, Maracatus, Afoxés, Cocos de Roda, Baianas, Fandangos, Taieiras, Pastoris e tantas outras manifestações culturais dão vida a tradições que resistem ao tempo, carregadas de fé, memória e identidade.

Celebrado em 22 de agosto, o Dia da Cultura Popular reforça a importância dos saberes transmitidos de geração em geração. Em Maceió, um dos símbolos mais emblemáticos dessa herança é o Guerreiro Alagoano, manifestação marcada por chapéus imponentes, fitas coloridas, brilhos, personagens e passos que narram um enredo festivo.

E é justamente no mês em que se exalta a cultura que nasce um novo capítulo nessa história: o Guerreiro Grande Poder, grupo que fará sua estreia no Festival da Cultura Popular, realizado pelo Maracatu Baque Alagoano, no dia 23 de agosto, em Jaraguá, com apoio da Fundação Municipal de Ação Cultural (FMAC).

O Guerreiro Grande Poder não surgiu por acaso. Ele nasceu do desejo de manter viva a chama acesa por Mestre Verdelinho, um dos nomes mais importantes da cultura popular alagoana. Mestre do Coco de Roda e do Pagode Alagoano, ele também era apaixonado pelo Guerreiro, brincadeira que marcou sua vida e inspirou seus filhos.

Dois anos atrás, o sonho ganhou corpo. Entre ensaios, rodas de conversa, partilha de saberes e muita vontade de colocar o Guerreiro na rua. Pouco a pouco, a ideia tomou forma, reunindo filhos, amigos e amantes da tradição.

Resgatando o sonho do pai, Nildo Verdelinho atua como mestre do Guerreiro Grande Poder. Foto: Higor Vinícius/ Ascom FMAC
Resgatando o sonho do pai, Nildo Verdelinho atua como mestre do Guerreiro Grande Poder. Foto: Higor Vinícius/ Ascom FMAC

“Minha inquietação nasceu quando percebi que muita coisa estava se perdendo. Mestres estavam partindo e levando consigo um conhecimento imenso sobre essa brincadeira tão rica. Sempre foi meu desejo trazer isso de volta, para que as pessoas conheçam e vivam a beleza do Guerreiro. Cresci com a sede do Guerreiro na frente da minha casa, aprendi vendo os personagens, as danças, as peças. Era um sonho distante, mas que agora se realiza”, emociona-se Nildo Verdelinho, filho do mestre e um dos idealizadores do projeto.

Nildo conta que a ideia ganhou força a partir de encontros culturais na Comunidade Azul e cresceu com o apoio de amigos e parceiros, principalmente Juliana Barreto, Daniel Ginga e Mestra Vânia.

“Tudo ganhou força quando participei de um projeto na Comunidade Azul. Passaram dois filmes sobre o Guerreiro e me convidaram para comentar. Enquanto falava, senti aquela chama reacender. As pessoas se encantaram com a história, e ali mesmo decidimos: vamos botar esse Guerreiro na rua. Começamos a ensaiar sem chapéu, sem traje, no meio da rua, apenas pelo prazer de brincar. Foram dois anos assim, movidos pelo amor à tradição. Hoje, ver tudo pronto é gratificante. É resistência, é pertencimento”, acrescenta.

Geninho, Iris e Nildo carregam com orgulho o legado de Mestre Verdelinho e os saberes deixados por ele. Foto: Higor Vinícius/ Ascom FMAC
Geninho, Iris e Nildo carregam com orgulho o legado de Mestre Verdelinho e os saberes deixados por ele. Foto: Higor Vinícius/ Ascom FMAC

Atravessando Gerações

A emoção de Nildo se multiplica no olhar dos irmãos e dos filhos que agora pisam nos mesmos palcos onde Mestre Verdelinho deixou sua marca. Para Geninho Verdelinho, filho caçula do mestre, a estreia do Grande Poder é a concretização de um sonho coletivo.

“Comecei acompanhando meu pai aos seis anos. Ele me levava aos palcos e eu sempre achei muito bonito. Hoje, realizar esse sonho é indescritível. O mais emocionante é ver minha filha também se encantando, do mesmo jeito que aconteceu comigo. Não foi algo que eu impus, partiu dela. E isso me faz entender que essa tradição é viva, que ela passa naturalmente para quem sente”, conta, com a voz embargada.

Geninho lembra que cada etapa dessa caminhada foi feita de afeto e colaboração. “Se chegamos até aqui, foi pelo abraço que recebemos. Amigos que acreditaram, gente que ajudou com chapéus, com apoio, com presença. É lindo ver que a cultura une as pessoas. Esse Guerreiro é feito em família, com amigos, com gente que acredita. A gente tem no sangue essa tradição, mas não faria sentido se não tivesse essa rede junto. Quando a gente entra no ensaio, é como se o Mestre Verdelinho estivesse ali sorrindo para a gente”, completa.

A emoção também toma conta de Iris Verdelinho, esposa de Nildo, que hoje coordena a equipe e auxiliou na criação dos chapéus e viveu intensamente a preparação do grupo. “O Guerreiro encanta. Só vivendo para entender. Foram dois anos de ensaios com muita dedicação. Agora, não vemos a hora de mostrar para todo mundo o resultado desse sonho coletivo”, diz.

Apaixonada por cultura, Mestra Vânia foi a responsável por produzir todos os chapéus do grupo. Foto: Higor Vinícius/ Ascom FMAC
Apaixonada por cultura, Mestra Vânia foi a responsável por produzir todos os chapéus do grupo. Foto: Higor Vinícius/ Ascom FMAC

Muito Além da Dança

Quem vê os chapéus imponentes e os trajes bordados com primor não imagina quantas mãos se uniram para criar essa beleza. Mestra Vânia, artesã há mais de 40 anos, deu vida às peças que coroam os personagens do Guerreiro.

“O artesão não faz só por fazer. Cada peça tem amor e história. Quando criei esses chapéus, ouvi as histórias de mestre Verdelinho, os desejos de Nildo, coloquei neles toda a inspiração que a cultura popular me traz”, afirma.

O Guerreiro Grande Poder estreia trazendo personagens clássicos, a Rainha, a Estrela de Ouro, a Estrela Dalva, o General, as Caboclinhas, diversos outros e a energia vibrante que transforma fé e memória em espetáculo.

O Festival da Cultura Popular também será palco para a celebração de um marco: os 18 anos do Maracatu Baque Alagoano, grupo que desde 2007 mantém viva a batida ancestral do maracatu no estado.

“São 18 anos fomentando a cultura afro-alagoana. O Baque surge em um momento de retomada do Maracatu em Alagoas, depois de um longo período de silêncio, fruto das perseguições culturais do passado. Hoje, celebramos com orgulho e resistência”, destaca Helton Santos, coordenador do grupo.

Maracatu Baque Alagoano resgata manifestação cultural em Maceió. Foto: Cortesia
Maracatu Baque Alagoano resgata manifestação cultural em Maceió. Foto: Cortesia

O Baque é exemplo de como a cultura se reinventa sem perder a essência. De oficinas a cortejos no Carnaval, o grupo se tornou referência, inspirando outros maracatus e fortalecendo a cena cultural alagoana.

Neste sábado (23), ele divide a festa com o Guerreiro Grande Poder e outros grupos culturais, num diálogo que mostra que a diversidade é o coração da cultura popular.

Essas histórias só são possíveis porque há quem acredite na força da tradição. Além de apoiar eventos como o Festival da Cultura Popular, a Prefeitura de Maceió, por meio da FMAC, tem investido em ações que garantem a preservação dos saberes.

Em 2024, o projeto Folguedos na Rede levou 40 mestres da cultura popular para ministrar aulas em 40 escolas da rede municipal, aproximando crianças das manifestações culturais.

Outra iniciativa é o edital Vem Pra Praça, que criou um credenciamento específico para grupos de folguedos, garantindo visibilidade e oportunidades para mestres e brincantes.

Com esses avanços, somados à paixão de quem brinca e de quem cria, Maceió reafirma sua identidade e mostra que a cultura não é apenas herança: é futuro.

FMAC

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